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fantasporto 2020

A vida dos músicos das ruas do Porto deu um filme

“Por Detrás da Moeda” é a primeira longa-metragem de Luís Moya e mostra a vida de seis músicos que atuam pelas ruas do Porto.

A antestreia aconteceu a 29 de Fevereiro, na 40ª edição do Festival Fantasporto.

Maria Martinho

Observador

9 Março 2020

A paixão pelo cinema de Luís Moya vive em paralelo com as suas funções como repórter de imagem em televisão. “Um dia gostava de me dedicar a 100% ao cinema, só não o faço por questões monetárias”, explicou em entrevista ao Observador.

 

O realizador, que estudou cine-vídeo na Escola Superior Artística do Porto e na Escola de Artes Saint-Lukas em Bruxelas, tem desenvolvido alguns projetos de cinema independente, curtas-metragens, onde a ficção e o documentário se fazem notar. Em 2013 realizou o seu primeiro documentário “Mia mia Sudan taman taman”, rodado no Sudão durante o referendo da independência do Sudão do Sul, onde mostra  “o lado humano e feliz de uma guerra civil”. O trabalhou mereceu o Prémio Cinema Português Fantasporto, sendo também distinguido no Farcume – Festival Internacional de Curtas-metragens de
Faro.


Motivado pelo reconhecimento do seu trabalho, Luís estava à procura de um tema para um próximo projeto. Encontrou-o durante um almoço numa esplanada perto da Avenida dos Aliados. “A conversa foi interrompida por uma voz rouca acompanhada por uma guitarra desafinada”, conta. A
curiosidade levou-o a ir ter com o músico de 50 anos e de óculos de sol, acabando mesmo por cantar com ele sentado no chão um tema dos Pink Floyd. “Era uma figura entre o Jorge Palma e o Bob Dylan, estava a fazer aquilo feliz, sem vergonha”, recorda.


Seguiram-se longos passeios pela cidade em busca de artistas que ganham a vida a dar música aos outros, de forma livre e completamente espontânea.

 

Procurei conhecer músicos que estão na rua pura e dura, não aquele turista que vem ganhar uns trocos e tem uma vida confortável.


 

 

O processo longo, durou cinco anos. “Não foi fácil entrar no mundo deles, a maioria são muito desconfiados, pensam logo que nos estamos a aproveitar (…) São pessoas muito fechadas e de pé atrás, já tiveram experiências traumatizantes e pensam que toda a gente os está a tentar explorar. O meu filme não é para explorar ninguém, é para divulgar e dar a minha visão enquanto realizador que é promover o artista de rua e dar a conhecer uma realidade que ninguém conhece. Porque o pessoal passa na rua e

chama-os de coitadinhos ou drogados. Quero mostrar que há ali grandes pessoas e artistas que as pessoas não fazem ideia”, apontou.
 

Depois de muitas horas de conversa e alguns copos pagos em esplanadas, o realizador ganhou a confiança de seis músicos, chegou mesmo a visitar os quartos onde vivem e a conhecer o seu passado. “O primeiro com quem me cruzei junto aos Aliados, por exemplo, pisou os grandes palcos nos anos 80 e partilhou o top de vendas com os Xutos & Pontapés. Hoje está na rua.” Tratava-se de Alexandre Amorim, membro fundador dos Pippermint Twist, banda que
entrou numa coletânea do Rock Rendez Vous e contava com Miguel Cerqueira, baixista fundador dos Trabalhadores do Comércio.

 

A intenção do realizador passava partilhar os desabafos destas pessoas, mostrar como vivem e o que os levou a cantar ou a tocar nos passeios. “Quis retratar a vida deles além do seu aspeto. Por cantarem na rua com uma caixa de sapatos à frente, muitos consideram-nos pedintes, mas no fundo estão a fazer aquilo que gostam de uma forma livre, tal como eu.”


Há perfeitos anónimos a tocar, uns há mais de duas décadas, a céu aberto no Porto, mas também nomes conhecidos, como o de Nuno Norte. “O Nuno Norte foi dos primeiros músicos de rua no Porto, na altura chamavam-lhe muita coisa menos isso. Foi inscrito num programa de televisão, ganhou e catapultou para os palcos. A vida dá muitas voltas, tanto estás lá em cima como no fosso. O contrário também acontece, o Nuno tinha a experiência disso, esteve nos dois lados”, explicou o realizador de 34 anos, que usou covers e originais cantados por estes artistas para marcar as sequências de um filme, cuja maioria dos planos partem da sua experiência em sair à rua com uma câmara na mão.


Em 93 minutos, o realizador de “Por Detrás da Moeda”, que também aparece no ecrã, garante estar espelhada a relação próxima que teve com os seis protagonistas, bem como o quotidiano de uma cidade que “irá desaparecer daqui a uns anos”.


“Admiro a coragem desta gente, podiam estar a trabalhar noutro sítio, alguns deles, que têm formações. Estão a dar um concerto na rua, um espetáculo, quem quiser parar e ver pôr uma moeda, ninguém obriga ninguém. Com esse dinheiro pagam as contas, compram calçado, sustentam os filhos. É preciso ter coragem, neste país, viver da música, ou cinema, ou qualquer arte. Eu não tive essa coragem, continuo a trabalhar e a conciliar com a paixão que tenho.”
 

Luís Moya já está a rodar o seu próximo documentário nas Bahamas e espera terminá-lo ainda este ano. Até lá, o circuito de exibição de “Por Detrás da Moeda” está a cargo da produtora Filmógrafo e a sua estreia decorreu no dia 29 de Fevereiro, no Fantasporto, no Teatro Rivoli, no Porto. A 40ª edição do festival terminou a 8 de março.

festival fantasporto

São dez dias de Festa para o Mundo do Cinema, onde produtores, realizadores, atores, atrizes, distribuidores e (muito) público se fundem num programa multifacetado, com filmes de todas as proveniências e géneros mas com uma tónica, o Fantástico. Não é, assim, de admirar que, a par de um filme de ficção científica ou de terror, seja exibido um drama intimista, um documentário, um filme de autor
ou até uma obra experimental.
 
São 4 secções competitivas com júris internacionais próprios, que se “alimentam” das mais recentes produções mundiais, vindas de todo o mundo. Centenas de curtas e longas metragens inéditas em Portugal batem-se por um lugar no Fantasporto e pelos seus prémios prestigiados. Há ainda conferências, debates, Q&A's, escolas de cinema que mostram os seus filmes, apresentações de livros,
exposições de Artes Plásticas, apelando sempre à criação do gosto cultural.

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Imagem das filmagens da curta-metragem “Por Detrás da Moeda”, de Luís Moya; fotógrafo desconhecido

trailer oficial de “Por Detrás da Moeda” de luís moya

imagem das filmagens “Por Detrás da Moeda” 

Imagem das filmagens de "por detrás da moeda"

por fotógrafo desconhecido

luís moya recebe o prémio do público no fantasporto 2020. fotografia pelo jornalista álvaro tallarico

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